terça-feira, 1 de março de 2011

Ensino religioso não será implantado nas escolas públicas municipais do Rio de Janeiro

Decisão do Conselho Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro elimina qualquer possibilidade de ser implantado ensino religioso nas escolas públicas municipais do Rio de Janeiro. Veja no Diário Oficial do dia 24 de fevereiro de 2011. 
E viva o Estado laico!  


ENSINO RELIGIOSO NAS ESCOLAS

No Diario Oficial desta 5a feira, dia 24 de fevereiro de 2011, foi publicada a
decisão do Conselho Municipal de Educação da Cidade do Rio de Janeiro,
eliminando completamente a possibilidade de ser implantado ensino religioso nas
escolas municipais do Rio de Janeiro
Foi fruto de um longo processo de discussão e amadurecimento.
A implantação do ensino religioso nas escolas sempre foi uma das bandeiras dos
neopentecostais.
As ponderações da relatora foram fulminantes. Destaco os seguintes trechos:
“Se, como prescreve a lei, o ensino religioso é de matrícula facultativa ao
aluno, como pode fazer parte dos horários normais das escolas públicas de Ensino
Fundamental? Farão parte das 800 horas de carga horária mínima estipulada? Como
computar a carga horária dos alunos que optarem por não freqüentá-lo? “
“Como pensar o estabelecimento de conteúdos que respeitem a diversidade Cultural
e religiosa, ouvindo entidades civis constituídas pelas diferentes denominações
religiosas, sem que isso represente qualquer forma de proselitismo?”
“A consulta a essas instituições religiosas poderia ser interpretada como uma
forma de ingerência em matéria que cabe ao Estado? Quais critérios seguir para o
oferecimento de aulas/turmas que levem em consideração a diversidade de credos
(ou ausência deles) dos alunos?”
“Como equacionar a representatividade de credos religiosos e os critérios
oficiais de organização de turmas pautados na relação adulto-criança/jovem?”
“Quantos e com que formação deveriam ser os professores credenciados para esse
cargo?Quais as implicações jurídicas, administrativas, financeiras e estruturais
seriam decorrentes dessa medida?”
“O Conselho Municipal do Rio de Janeiro, reafirmando o caráter laico da escola
pública, compreende que o ensino religioso não se constitui em uma área de
conhecimento específica que deva ser tratada nos moldes disciplinares”.
“O Conselho compreende que ele integra o que as Diretrizes Curriculares
Nacionais nomeiam como Princípios (éticos, estéticos e políticos), devendo,
portanto, ser tratado, na condição de Princípio, como um balizador dos Projetos
Políticos Pedagógicos, sem hierarquização face a outros valores que circulam na
cultura”.
Abaixo, a íntegra da decisão.
ÁTILA NUNES NETO
DIÁRIO OFICIAL de 24 de fevereiro de 2011
CONSELHO MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO
ATO DO CONSELHO
CÂMARA DE POLÍTICAS SOCIAIS
INTEGRADAS À EDUCAÇÃO
PARECER N.º04/2011
Opina sobre a aplicabilidade do disposto no art.33 da Lei nº 9.394, de
20/12/1996
(Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) tratando do Ensino Religioso.
HISTÓRICO
Em 14 de dezembro de 2010, o Conselho Nacional de Educação publicou a Resolução
n° 7, que fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental de 9
(nove) anos.
A leitura atenta da referida Resolução esteve em pauta neste Conselho, em
sessões realizadas nos meses de janeiro e fevereiro do corrente ano, propiciando
um substantivo debate. Mereceram destaque o Artigo 15 e seu 6° parágrafo, que
tratam do Ensino Religioso na organização dos Componentes Curriculares
Obrigatórios do Ensino Fundamental, resultando neste parecer cujo objetivo é
apresentar o posicionamento do Conselho Municipal do Rio de Janeiro face ao tema
em tela.
Considerando a diversidade que constituiu a sociedade brasileira e a garantia
constitucional do direito dos cidadãos em exercer livre e democraticamente seus
pensamentos e crenças, todo processo que envolve o campo religioso é de grande
complexidade e requer cuidado em sua abordagem, sobretudo quando se refere à
normatização do Ensino Religioso pelos Sistemas de Ensino.
Vários fatores se colocam em conflito e contribuem para essa complexidade: a
relação entre Estado e Religião; a relação hierárquica entre instituições
religiosas hegemônicas e outras de menor visibilidade; o respeito à diversidade
e às diferenças religiosas, bem como o direito ao ateísmo ou agnosticismo; o
papel da escola e da família na formação das crianças e jovens; o sentido da
escola pública. A construção e constante reformulação de documentos legais para
este campo são exemplares da complexidade e do reduzido consenso que a temática
alcança. Vejamos:
Na Constituição Brasileira, datada de 1988, encontramos:
Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira
a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos,
nacionais e regionais.
§ 1º O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos
horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. Em 20 de dezembro
de 1996, em conformidade com a Constituição promulgada em
1988, foi editada a Lei 9.394, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional,
sendo o ensino religioso assim tratado :
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos
horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido,
sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas
pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter:
I – confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu
responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e
credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou
II – interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades
religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa.
Esse artigo da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sete meses depois
de sua publicação, sofreu alteração através da Lei 9.475, de 22 de julho de
1997, passando a vigorar com a seguinte redação:
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da
formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das
escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade
cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos
conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e
admissão dos professores.
§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes
denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso.”
Seguindo essa redação, o artigo 15 da Resolução n° 7 do Conselho Nacional de
Educação, que “fixa Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental
de 9 (nove) anos”, apresenta o ensino religioso entre os componentes
curriculares obrigatórios do Ensino Fundamental.
Art. 15 “Os componentes curriculares obrigatórios do Ensino Fundamental serão
assim organizados em relação às áreas de conhecimento:
I – Linguagens:
a) Língua Portuguesa;
b) Língua Materna, para populações indígenas;
c) Língua Estrangeira moderna;
d) Arte; e
e) Educação Física;
II – Matemática;
III – Ciências da Natureza;
IV – Ciências Humanas:
a) História;
b) Geografia;
V – Ensino Religioso.”
§ 6º O Ensino Religioso, de matrícula facultativa ao aluno, é parte integrante
da formação básica do cidadão e constitui componente curricular dos horários
normais das escolas públicas de Ensino Fundamental, assegurado o respeito à
diversidade cultural e religiosa do Brasil e vedadas quaisquer formas de
proselitismo, conforme o art. 33 da Lei nº 9.394/96.
Entendendo como controversa a matéria em questão, a Procuradoria Geral da
República, no dia 2 de agosto de 2010, propôs ao Supremo Tribunal Federal uma
Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4439), solicitando interpretação
constitucional do artigo 33 da Lei de Diretrizes de Bases, no sentido de tornar
clara a incompatibilidade entre a laicidade da escola pública e o ensino de
caráter confessional. A matéria aguarda decisão final do Superior Tribunal de
Justiça, estando em tramitação no referido órgão.
VOTO DA RELATORA
O amplo debate que cerca a normatização do ensino religioso afeta este Conselho
sob duas perspectivas. Uma, de natureza político-filosófica, que diz respeito a
tornar pública para a sociedade a compreensão que este Conselho tem do tema em
tela. Outra, de natureza pragmática, refere-se às deliberações necessárias para
que as redes de ensino organizem seus currículos e seus quadros docentes.
Muitos pontos polêmicos e conflituosos ainda se fazem presentes, sem que tenham
sido tocados pelas alterações dos textos oficiais. Alguns já foram tratados por
este Conselho no Parecer 23, de 31 de julho de 2001. Outros permanecem em
aberto, reafirmando o caráter polêmico da temática.
Se, como prescreve a lei, o ensino religioso é de matrícula facultativa ao
aluno, como pode fazer parte dos horários normais das escolas públicas de Ensino
Fundamental? Farão parte das 800 horas de carga horária mínima estipulada? Como
computar a carga horária dos alunos que optarem por não freqüentá-lo?
Estas questões associam-se a outras: Como pensar o estabelecimento de conteúdos
que respeitem a diversidade cultural e religiosa, ouvindo entidades civis
constituídas pelas diferentes denominações religiosas, sem que isso represente
qualquer forma de proselitismo? A consulta a essas instituições religiosas
poderia ser interpretada como uma forma de ingerência em matéria que cabe ao
Estado? Quais critérios seguir para o oferecimento de aulas/turmas que levem em
consideração a diversidade de credos (ou ausência deles) dos alunos?
Como equacionar a representatividade de credos religiosos e os critérios
oficiais de organização de turmas pautados na relação adulto-criança/jovem?
Quantos e com que formação deveriam ser os professores credenciados para esse
cargo?
Quais as implicações jurídicas, administrativas, financeiras e estruturais
seriam decorrentes dessa medida?
Considerando os muitos questionamentos que permanecem em aberto e as
conseqüências administrativas de uma adequação precipitada numa rede de tamanha
extensão, é recomendável que nenhuma decisão seja tomada até que a ação de
inconstitucionalidade apresentada pela Procuradoria Geral da República seja
votada.
O Conselho Municipal do Rio de Janeiro, reafirmando o caráter laico da escola
pública, compreende que o ensino religioso não se constitui em uma área de
conhecimento específica que deva ser tratada nos moldes disciplinares.
O Conselho compreende que ele integra o que as Diretrizes Curriculares Nacionais
nomeiam como Princípios (éticos, estéticos e políticos), devendo, portanto, ser
tratado, na condição de Princípio, como um balizador dos Projetos Políticos
Pedagógicos, sem hierarquização face a outros valores que circulam na cultura.
DECISÃO DA CÂMARA
Rita Marisa Ribes Pereira
Iza Locatelli
Sérgio Sodré Peçanha
Marcelo Pereira
Maria de Nazareth M. de B. Vasconcellos
Luiz Otávio Neves Mattos
Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2011.
DECISÃO DO PLENÁRIO
O presente Parecer foi aprovado por unanimidade.
Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 2011.
http://redeafro.ning.com/forum/topics/ensino-religioso-nas-escolas

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